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sexta-feira, 31 de julho de 2015

"DE FRENTE PRO CRIME": TREM PASSA POR CIMA DE CORPO EM MADUREIRA! DEMONSTRAÇÃO DE DESUMANIDADE

Queridos leitores.



Tentei escrever ontem, assim que assisti a reportagem sobre o duplo atropelamento duplo de um homem, em Madureira-RJ, mas, infelizmente não tive condições. Contudo, hoje o faço ainda mais indignada que ontem, com essa situação lamentável!

Pra quem não assistiu à reportagem, vou explicar. Foi noticiado na TV que um homem havia sido atropelado na última terça-feira, dia 28, do corrente. O homem, identificado como Adílio Cabral dos Santos, vendedor ambulante, foi atingido por um trem e estava na linha férrea aguardando atendimento, segundo a versão do porta-voz da Supervia, concessionária responsável pelo transporte. Ver matéria: http://g1.globo.com/rio-de-janeiro/noticia/2015/07/supervia-admite-que-autorizou-trem-passar-sobre-corpo-de-homem-no-rio.html

Pelo que pudemos constatar, há muitas contradições entre a versão da concessionária, do Corpo de bombeiros e pelo que vimos e ouvimos no vídeo/reportagem. A concessionária afirma que havia acionado o Corpo de bombeiros para o atendimento da vítima, e os policiais negam que tenham sido chamados para esse atendimento e por aí vai. O que importa, não é mesmo? Apenas "o corpo estendido no chão", parafraseando trecho da música de João Bosco. 

Leitores, o que mais me choca não é o despreparo dos funcionários, mas a insensibilidade, a barbárie, a crueldade, a desumanidade estampada, retratada nas atitudes medíocres de pessoas-empresas que só visam o lucro, a pressa em ganhar dinheiro, o imediatismo, a ambição desmedida que passa por cima de tudo e de todos...literalmente. 


Não quero discutir aqui a condição daquele homem, ou melhor, eu quero! Segundo informações, ele era um trabalhador, ex-presidiário que, como não achava emprego, resolveu vender doces para sobreviver naquela área em que foi atropelado. Talvez por isso não tenha tido importância, não tenha sido valorizado, afinal, era um "João-ninguém". Se ele estivesse em evidência, por exemplo, na "Operação lava a jato", no "Mensalão", "Operação Sanguessuga", "Máfia dos fiscais", etc., etc, ele teria muito mais valor e uma assistência melhor, porém, Adílio era mais um, um "João-ninguém", sem advogado, sem hábeas corpus, sem privilégios!  

Hoje, vendo mais uma vez uma reportagem sobre o assunto pude assistir à mãe de Adílio dizer que, quando assistiu aos noticiários e viu que o trem havia passado por duas vezes sobre o corpo de um mesmo homem, ela achou um absurdo, um desrespeito ao ser humano. Depois, quando ela constatou que aquele homem era seu filho, somou à indignação, a dor de ter perdido o filho de forma tão cruel!

Citando, dessa feita, o poeta baiano Castro Alves, em seu poema, "Navio Negreiro", eu diria: “Senhor Deus dos desgraçados!/ Dizei-me vós, senhor Deus!/ Se é loucura… se é verdade/ Tanto horror perante os céus?!/ Ó mar, por que não apagas/ Co’a a esponja de tuas vagas/ De teu manto este borrão?” 


Nosso Deus! Eu fico pensando: Que mundo é esse? Muitos de nós não admitimos que uma situação dessa ocorra nem com um cão, um animal qualquer e, em se tratando de seres humanos isso se torna inconcebível! Quem é mesmo o irracional dessa história? Será que aquele homem que sinalizou pra o trem avançar, quanto quem autorizou não se comoveram com aquela cena fatídica? Será que não pensaram na família da vítima? Ou será que apenas enxergaram um corpo estendido no chão? O borrão só aumenta, contaminando todo o mar.

Ah, a letra da música de João Bosco, que eu mencionei anteriormente...

DE FRENTE PRO CRIME
             João Bosco
  
Tá lá o corpo
Estendido no chão
Em vez de rosto uma foto
De um gol
Em vez de reza
Uma praga de alguém
E um silêncio
Servindo de amém...

O bar mais perto
Depressa lotou
Malandro junto
Com trabalhador
Um homem subiu
Na mesa do bar
E fez discurso
Prá vereador...

Veio o camelô
Vender!
Anel, cordão
Perfume barato
Baiana
Prá fazer
Pastel
E um bom churrasco
De gato
Quatro horas da manhã
Baixou o santo
Na porta bandeira
E a moçada resolveu
Parar, e então...

Tá lá o corpo
Estendido no chão
Em vez de rosto uma foto
De um gol
Em vez de reza
Uma praga de alguém
E um silêncio
Servindo de amém...

Sem pressa foi cada um
Pro seu lado
Pensando numa mulher
Ou no time
Olhei o corpo no chão
E fechei
Minha janela
De frente pro crime...

Veio o camelô
Vender!
Anel, cordão
Perfume barato
Baiana
Prá fazer
Pastel
E um bom churrasco
De gato
Quatro horas da manhã
Baixou o santo
Na porta bandeira
E a moçada resolveu
Parar, e então...

Tá lá o corpo
Estendido no chão...

Quanta demonstração de indiferença! Parece que o povo está ficando calejado com essa situação. É spray de pimenta, bala perdida, socos, repressão, opressão, coação, cassetete, mordaça, lei do silêncio, bombas de efeito (i)moral, que isso tudo (e muito mais) já passou a fazer parte do cotidiano. E nós, cada dia mais, impotentes diante desse horror. Agora lembrei-me de Drummond:

"Meu Deus, por que me abandonaste
se sabias que eu não era Deus,
se sabias que eu era fraco.
Mundo mundo vasto mundo
se eu me chamasse Raimundo
seria uma rima, não seria uma solução."

Navegando aqui pela net, achei um poema, com a mesma temática que estamos refletindo aqui. 


Um corpo estendido no chão.
Um aglomerado de pessoas, estáticas,
conjeturando....
O que levou aquele ser, aquela condição?
O sangue jorrado na areia,
o corpo imóvel, 
dois pés, apenas com meias.
Sem nome ninguém sabe.
Chamaram socorro,
mas o mesmo não chegou.
Se tivesse chegado... 
teria sua vida salvado?
Seu corpo estendido no chão.
Já não tem um amanha.
Já não bate seu coração.
Alguns dizem,
era um bom homem.
Trabalhador,daqui morador.
Alguns passam, 
Alguns chegam,outros saem,
Chega alguém, chega correndo...
vem chorando, clamando sua dor.
Abraca aquele corpo no chão.
Quanto lamento, quanta tristeza...
Não ha nada que pague,
Apenas mais uma família,
cheia de dor e incertezas.
Daquela vida que se foi.
Somos todos nos responsáveis.
porque, calamos, 
apenas observamos.
Aquele corpo estendido no chão.
Nada fazemos, nada mudamos,
apenas mudos olvidamos,
outros dias, outros mais, 
corpos estendidos no chão .
Que jaz sem voltar jamais,
a bater aquele coração.

                      Fadinha de Luz

O filósofo alemão Walter Benjamin disse que "o horror nos empobrece". É...acho que estamos ficando cada vez mais pobres.


CARPE DIEM!!! 

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