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segunda-feira, 2 de julho de 2012

DEPOIS DE AMANHÃ...

Queridas e queridos leitores.

Hoje quero presenteá-los com uma poesia de Álvaro de Campos, um dos heterônimos de Fernando Pessoa, poeta português, aliás, um dos maiores poetas do século XIX. 

Fernando Pessoa criou várias "entidades", várias pessoas que habitam em um mesmo poeta. Não digam que isso é coisa de maluco. Mas, não dizem que "de médico e louco todo mundo tem um pouco"? Talvez isso justifique e nos tranquilize também...rsss.

Quando nos referimos a  Fernando Pessoa, ele mesmo podemos usar a expressão ortônimo, fazendo referência a sua personalidade original. Contudo, quando nos referimos a alguma de suas criações, usamos a expressão heterônimo.

Deixo aqui a explicação de Pessoa sobre seus heterônimos:
"Por qualquer motivo temperamental que me não proponho analisar, nem importa que analise, construí dentro de mim várias personagens distintas entre si e de mim, personagens essas a que atribuí poemas vários que não são como eu, nos meus sentimentos e idéias, os escreveria.
Assim têm estes poemas de Caeiro, os de Ricardo Reis e os de Álvaro de Campos que ser considerados. Não há que buscar em quaisquer deles idéias ou sentimentos meus, pois muitos deles exprimem idéias que não aceito, sentimentos que nunca tive. Há simplesmente que os ler como estão, que é aliás como se deve ler."

Olhem, não é pouca monta não; cada um dos heterônimos tem biografia, tem "vida própria", data de nascimento, lugar de origem, estilo próprio, enfim, são criações do próprio Fernando Pessoa. Há quem diga que ele era esquisofrênico, que fazia piadas com essa ideia da heteronímia, etc, etc. Mas o fato é que existem poemas muito bons, atribuídos a esses heterônimos.

Tem um poema de Fernando Pessoa, ortônimo, que é muito conhecido:

 Autopsicografia

O poeta é um fingidor
Finge tão completamente 
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.

E os que lêem o que escreve,
Na dor lida sentem bem,
Não as duas que ele teve,
Mas só a que eles não têm.

E assim nas calhas de roda
Gira, a entreter a razão,
Esse comboio de corda
Que se chama coração.

Segue abaixo um poema de Álvaro de Campos, uma das 127 criações de Pessoa. Pasmem! Em média, ele criou 127 heterônimos. Isso é coisa de gênio ou podem atribuir o nome que quiserem.

 




Adiamento
                                  Álvaro de Campos
 
   Depois de amanhã, sim, só depois de amanhã... 
   Levarei amanhã a pensar em depois de amanhã, 
   E assim será possível; mas hoje não... 
   Não, hoje nada; hoje não posso. 
   A persistência confusa da minha subjetividade objetiva, 
   O sono da minha vida real, intercalado, 
   O cansaço antecipado e infinito, 
   Um cansaço de mundos para apanhar um elétrico... 
   Esta espécie de alma... 
   Só depois de amanhã... 
   Hoje quero preparar-me, 
   Quero preparar-me para pensar amanhã no dia seguinte... 
   Ele é que é decisivo. 
   Tenho já o plano traçado; mas não, hoje não traço planos... 
   Amanhã é o dia dos planos. 
   Amanhã sentar-me-ei à secretária para conquistar o rnundo; 
   Mas só conquistarei o mundo depois de amanhã... 
   Tenho vontade de chorar, 
   Tenho vontade de chorar muito de repente, de dentro... 
 
   Não, não queiram saber mais nada, é segredo, não digo. 
   Só depois de amanhã... 
   Quando era criança o circo de domingo divertia-me toda a semana. 
   Hoje só me diverte o circo de domingo de toda a semana da minha infância... 
   Depois de amanhã serei outro, 
   A minha vida triunfar-se-á, 
   Todas as minhas qualidades reais de inteligente, lido e prático 
   Serão convocadas por um edital... 
   Mas por um edital de amanhã... 
   Hoje quero dormir, redigirei amanhã... 
   Por hoje, qual é o espetáculo que me repetiria a infância? 
   Mesmo para eu comprar os bilhetes amanhã, 
   Que depois de amanhã é que está bem o espetáculo... 
   Antes, não... 
   Depois de amanhã terei a pose pública que amanhã estudarei. 
   Depois de amanhã serei finalmente o que hoje não posso nunca ser. 
   Só depois de amanhã... 
   Tenho sono como o frio de um cão vadio. 
   Tenho muito sono. 
   Amanhã te direi as palavras, ou depois de amanhã... 
   Sim, talvez só depois de amanhã... 
 
   O porvir... 
   Sim, o porvir...


Esse poema reflete o pésssimo hábito que algumas pessoas têm de adiar as coisas, as atitudes, os sentimentos, os sonhos, em suma, a vida. Não podemos protelar as coisas! O tempo não volta atrás, a nossa vida não retrocede.  


Não  espere a concretização dos sonhos se você ficar de braços cruzados.       

Saia da inércia! 

Pare de reclamar!

Lute! 

Vá em busca dos seus ideais! 

Sorria!

Chore!

Ame mais!

Perdoe mais!

Viva a vida! 

Seja feliz!

Carpe diem!!

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